sexta-feira, 20 de abril de 2007

Mediterrâneo RH (4)

Mais uma entrevista com um dos participantes no projecto «Ágora RH» (explicação do projecto no post 1 sobre este tema). Desta vez, um representante de Itália.

Filippo Abramo (Itália)
«O Mediterrâneo é um lugar giro, mas complicado.»

Filippo Abramo é o ex-presidente da European Association for Personnel Management (EAPM); tem um cargo denominado past president, que explica como sendo «uma espécie de guarda-chuva da federação europeia». Presidiu à Federação Mediterrânica de Recursos Humanos (FMRH) e actualmente é presidente do Grupo da Sardenha de Recursos Humanos, um grupo regional que faz parte da Associazione Italiana per la Direzione del Personale (AIDP).
O senhor é mesmo da Sardenha?
Não. A maior parte da minha vida estive em Milão, no norte de Itália. Trabalhei em muitas companhias, a maior parte delas internacionais.
Em recursos humanos?
Não apenas. Trabalhei principalmente em organização. Agora trabalho no Banco da Sardenha, e estou na ilha, claro. Viajo muito, pelo trabalho e pelas actividades associativas. No banco sou encarregado dos recursos internos, as agências, os edifícios…
Quer dizer, agora gere coisas, em vez de gerir pessoas?
Sim, e é muito diferente. Posso dizê-lo porque estive nos dois lados. Gerir pessoas é mais complicado. Há as emoções… É preciso tentar ligar a performance da organização à performance individual para chegar aos objectivos do negócio. Não é fácil. E depois, em Itália, temos muitas leis e actividades de sindicatos que criam problemas nas abordagens dos negócios. Se se quiser de reestruturar algo numa organização, algo que não esteja a funcionar… Repare, o dever do gestor é fazer com que funcione… Em Inglaterra isso é muito fácil, decide-se e muda-se em dois ou três dias. Em Itália o gestor pode planear a mudança, mas quando vai para o campo, para executar, tem de discutir com os sindicatos.
São muito fortes em Itália?
Sim, muito. É preciso convencer os sindicalistas a fazerem coisas que eles normalmente não gostam de fazer. Porque reestruturar significa que pessoas têm de mudar de emprego, de território, procurar outro lugar.
Como é que resumiria o que é a gestão de recursos humanos no seu país?
Em Itália temos uma longa história de gestão de recursos humanos. Começámos logo depois da segunda guerra mundial. Houve muitas fases. No início era a do comando e do controlo, algo assim do género militar, com directores de pessoal que eram ou militares ou polícias. Agora é completamente diferente.
Quais é que são as grandes questões?
Para mim, a ligação entre o capital humano e a performance do negócio.
Os sindicatos discutem isso?
Começam a discutir. Emocionalmente são contra. Mas, sabe… E é a razão por que o trabalho do responsável de recursos humanos é agora muito mais complicado do que no passado, quando era fácil dar ordens e punir. Agora é preciso compreender as pessoas, comunicar com elas, tornar as coisas claras para elas. E levá-las a reconhecerem e entenderem o que são os objectivos. Não se pode ordenar para que obedeçam. É um trabalho complicado mas desafiante. A um director de recursos humanos o topo da gestão exige que compreenda o negócio em que está envolvido. No passado não era preciso. A principal competência tinha a ver com leis, sindicatos, talvez psicologia, esse tipo de coisas. Mas agora é preciso entender o negócio, por isso há que entender a economia, de forma a integrar o comité executivo das empresas. Eu faço parte do comité executivo do banco, e se quiser falar com os gestores das áreas tenho de conhecer os problemas, o mercado, o que não é fácil. Por outras palavras, o que eu quero dizer é que agora o responsável de recursos humanos não é um director de pessoal, é um gestor de negócios que toma conta das pessoas, o que é diferente.
Fale-me do projecto «Ágora RH». O que significa para si?
É realmente um verdadeiro desafio. Começamos há três anos. Bom, o Mediterrâneo sempre foi um lugar complicado. É um lugar giro, mas complicado. E nesta iniciativa tem a ver com as empresas, com os negócios, com a economia; é um campo em que podemos discutir, em que pode haver um encontro. Com os políticos já é diferente, há problemas, e depois mete-se a religião, o que ainda é pior. Mas o enfoque que procuramos tem a ver com o comércio, com as trocas, com as economias; Aí podemos encontrar-nos. Houve muitos encontros, de muitas pessoas, nos últimos dois mil anos neste espaço, até antes. Porque as pessoas sempre fizeram comércio, da Tunísia, da Líbia, de França, de Espanha. Empresa, comércio, negócio, é um campo onde podemos encontrar-nos. Neste grupo todos somos amigos, estamos juntos, mas temos costumes diferentes, e no projecto, nalguns tópicos, discutimos de forma árdua. Mas no fim conseguimos sempre chegar a acordo. Claro que temos problemas, sempre tivemos, todas as civilizações os tiveram. Há a necessidade de as pessoas discutiram, de se encontrarem, no comércio, nas empresas, no trabalho; foi essa a razão por que começámos. E depois de três anos de trabalho identificámos coisas comuns.
Acha que o Mediterrâneo será algum dia um espaço livre para a circulação de bens e de pessoas?
Essa é a questão mais complicada. Há um projecto da União Europeia que se chama «Projecto de Barcelona», com o qual se pretende criar no Mediterrâneo uma área de livre troca, em 2010. Esse projecto, que é oficial, que começou em 1995, na cidade de Barcelona, continua válido, mas 2010 já não está muito longe. Não é para integrar os países do Magreb na União Europeia, o que seria impossível, mas decerto procurará criar um espaço de troca, de facto, um espaço livre. Mas não acredito que aconteça em 2010.
E a parte Oriental do Mediterrâneo, quando poderá entrar no projecto «Ágora RH»? Portugal já entrou, mesmo o Mediterrâneo chegando apenas a Gibraltar…
Em relação à parte oriental do Mediterrâneo é mais complicado. Começámos com os países do Magreb porque há muitas relações as associações de recursos humanos deles e as dos países latinos da Europa. Os países do Magreb são francófonos. Era mais fácil começar, o projecto estava no início, não sabíamos o que ia acontecer. Preferimos começar numa base segura. E as coisas funcionaram. Agora estamos a projectar os próximos três anos, porque esta experiência é para continuar. E na segunda fase queremos estender o projecto. E a razão pela qual o colóquio final contou com a presença, como observadores, de pessoas de associações de países da parte oriental, de Chipre, da Síria, de Malta… Inclusive convidámos a associação turca, mas acabou por não participar.

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