Luís Bento
«Muito do que somos está aqui, no Mediterrâneo.»
Luís Bento foi um dos representantes da Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos (APG) no projecto «Ágora RH». Nesta pequena entrevista, faz uma síntese da participação portuguesa.
Como nasceu este projecto e qual foi nesse momento a participação portuguesa?
Não se pode precisar com rigor um momento específico para o nascimento do «Ágora RH». A ideia do projecto foi nascendo da necessidade de reencontro entre todo o espaço mediterrânico. Sempre existiu uma tradição de convidar as associações do Magreb para os congressos das associações do sul da Europa e dessas participações foi ganhando forma a ideia de se fazer algo em conjunto A Cimeira de Barcelona – MEDA –, ao redefinir a posição europeia de colaboração com o Magreb num quadro de cooperação inter-regional, facilitou todo o processo. O desenho e os contornos finais do projecto foram depois trabalhados num brainstorming em Paris, no qual participei em representação da APG, juntamente com o presidente da Direcção. A APG trouxe ao projecto uma grande experiência internacional de multi-culturalidade e de diálogo com todas as correntes associativas – a sua história; porque a APG é uma das mais antigas associações da Europa e do mundo, e é imensa a sua experiência de participação em diferentes redes colaborativas que tratam de questões de grande actualidade e inovadoras. O conhecimento mútuo, de muitos anos, entre a maior parte dos dirigentes associativos, foi absolutamente fundamental, pois projectos desta natureza só podem acontecer entre pessoas que já se conhecem, quando já existe uma relação.
Qual o grande objectivo desta participação?
O grande objectivo foi disponibilizar toda a nossa experiência e todo o nosso conhecimento às associações congéneres, além de aprender com as suas experiências e práticas – tão ricas e diversas – e contribuir para o reforço da identidade histórica mediterrânica, pois o que existe de mais relevante na nossa identidade, nos nossos hábitos, está nesta região. Temos andado virados para outros espaços – nórdico, anglo-saxónico, asiático –, esquecendo que muito do que somos está aqui, no mare nostrum, no Mar Mediterrâneo.
Que balanço faz do projecto, em termos globais?
No que respeita às conclusões obtidas, um sucesso; pela primeira vez, de forma estruturada, foi possível conhecer as grandes tendências demográficas da região mediterrânica, os diferentes modelos de gestão de recursos humanos, as práticas de responsabilidade social das organizações e o próprio funcionamento e as boas práticas das associações de recursos humanos. E tudo isto em colaboração com a Universidade Euromediterrânica – a Euromed Marselha – e dentro de um quadro de verdadeira cooperação entre países com influências e modelos políticos e religiosos tão diversos. É evidente que existiram dificuldades de vária ordem, mas todas foram ultrapassadas através do esforço dos dirigentes associativos e dos técnicos que contribuíram para o projecto e também dos mecanismos de entreajuda entretanto desenvolvidos.
E quanto à integração de uma visão genuinamente portuguesa nesse projecto?
Os nossos maiores contributos foram em três planos diferentes: vasta experiência de gestão multicultural, o que facilitou o termos assumido muitas vezes papéis de liderança; competência técnica na participação em gestão de projectos internacionais; e o prestígio internacional da APG, que possibilitou ultrapassar algumas dificuldades que a própria natureza do projecto colocou. A visão genuinamente portuguesa esteve presente nomeadamente no terceiro tema do projecto – responsabilidade social das organizações –, no qual a nossa experiência levou a que os parceiros nos atribuíssem a respectiva liderança.
Em que grandes áreas o projecto gerou conclusões? E como explica o enfoque nessas áreas?
O projecto gerou conclusões sobre os temas que constituíam o próprio objecto; ou seja, a demografia, os modelos de gestão de recursos humanos, as boas práticas associativas e a responsabilidade social das organizações. Como conclusões mais salientes, talvez as problemáticas demográficas, que associadas ao nível de desenvolvimento económico das diferentes economias vão colocar desafios brutais à Europa e aos países do Magreb. Na margem norte, a natalidade quase estagnada; na margem sul, ainda a crescer de forma significativa, mas com a melhoria do desenvolvimento económico do Magreb a procura da Europa para trabalhar vai estagnar e talvez estancar, dentro de cinco anos, exactamente numa altura em que a Europa vai necessitar de muita mão-de-obra. Diria que o Magreb como fonte de recrutamento de mão-de-obra para o sul da Europa está a desaparecer. Realço também o domínio da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentado, no qual foi possível verificar os enormes desníveis entre os países da margem norte e os da margem sul, principalmente nas questões ambientais e de eco-eficiência.
Dessas áreas, em qual ou em quais se destacou o contributo de Portugal?
A contribuição portuguesa foi assinalável nos diferentes domínios; mas, necessitando de destacar algo, talvez as boas práticas associativas – onde a revista «Pessoal» foi um dos casos de estudo – e a respeitante á responsabilidade social das organizações, em que a APG demonstrou deter um conhecimento e uma experiência que foram muito úteis a todos os parceiros. Aliás, isso mesmo foi realçado durante o colóquio final do projecto.
Que desafios coloca um espaço que se procura seja de encontro – e neste caso em termos de gestão das pessoas – quando ao mesmo tempo é um espaço que funciona como um muro entre dois mundo, um mais rico, outro mais pobre?
O espaço do Mediterrâneo é um espaço sui generis, pois além de um espaço de partilha de um elemento comum – o mare nostrum, o nosso mar – é também um espaço de partilha de identidades, de referências linguísticas, de histórias de conquistas e reconquistas, de formas de ser e de estar. Ao contrário de outros espaços que, em primeiro lugar, partilham e integram as respectivas economias, o Mediterrâneo é um espaço identitário. E no quadro dessa identidade subsistem modelos de desenvolvimento económico diferenciados, de base continental – os países da margem sul encontram-se no continente africano. As assimetrias – riqueza na margem norte, pobreza na margem sul – resultam essencialmente disso mesmo. Todavia, e paradoxalmente, a riqueza da margem norte depende hoje, essencialmente, da energia produzida na margem sul – principalmente o gás natural da Argélia. O espaço do Mediterrâneo está a reencontrar-se, a reafirmar-se, e não existe já aquele muro que de facto existiu no passado. As economias estão a complementar-se e, nos próximos anos, vamos assistir a um desenvolvimento fantástico nos países da margem sul, que irá esbater os diferenciais de riqueza que hoje são uma realidade.
O que é que aprendeu, em termos pessoais, com a sua participação no projecto «Agora RH»?
Conheci novas realidades geopolíticas e religiosas, encontrei respostas para dúvidas que tinha sobre o que é isto de ser português e de ser mediterrânico, reencontrei algumas raízes… E se calhar construí uma nova visão deste espaço de História e de memórias que, seguramente, é o nosso espaço. Nós somos daqui.
Luís Bento foi um dos representantes da Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos (APG) no projecto «Ágora RH». Nesta pequena entrevista, faz uma síntese da participação portuguesa.
Como nasceu este projecto e qual foi nesse momento a participação portuguesa?
Não se pode precisar com rigor um momento específico para o nascimento do «Ágora RH». A ideia do projecto foi nascendo da necessidade de reencontro entre todo o espaço mediterrânico. Sempre existiu uma tradição de convidar as associações do Magreb para os congressos das associações do sul da Europa e dessas participações foi ganhando forma a ideia de se fazer algo em conjunto A Cimeira de Barcelona – MEDA –, ao redefinir a posição europeia de colaboração com o Magreb num quadro de cooperação inter-regional, facilitou todo o processo. O desenho e os contornos finais do projecto foram depois trabalhados num brainstorming em Paris, no qual participei em representação da APG, juntamente com o presidente da Direcção. A APG trouxe ao projecto uma grande experiência internacional de multi-culturalidade e de diálogo com todas as correntes associativas – a sua história; porque a APG é uma das mais antigas associações da Europa e do mundo, e é imensa a sua experiência de participação em diferentes redes colaborativas que tratam de questões de grande actualidade e inovadoras. O conhecimento mútuo, de muitos anos, entre a maior parte dos dirigentes associativos, foi absolutamente fundamental, pois projectos desta natureza só podem acontecer entre pessoas que já se conhecem, quando já existe uma relação.
Qual o grande objectivo desta participação?
O grande objectivo foi disponibilizar toda a nossa experiência e todo o nosso conhecimento às associações congéneres, além de aprender com as suas experiências e práticas – tão ricas e diversas – e contribuir para o reforço da identidade histórica mediterrânica, pois o que existe de mais relevante na nossa identidade, nos nossos hábitos, está nesta região. Temos andado virados para outros espaços – nórdico, anglo-saxónico, asiático –, esquecendo que muito do que somos está aqui, no mare nostrum, no Mar Mediterrâneo.
Que balanço faz do projecto, em termos globais?
No que respeita às conclusões obtidas, um sucesso; pela primeira vez, de forma estruturada, foi possível conhecer as grandes tendências demográficas da região mediterrânica, os diferentes modelos de gestão de recursos humanos, as práticas de responsabilidade social das organizações e o próprio funcionamento e as boas práticas das associações de recursos humanos. E tudo isto em colaboração com a Universidade Euromediterrânica – a Euromed Marselha – e dentro de um quadro de verdadeira cooperação entre países com influências e modelos políticos e religiosos tão diversos. É evidente que existiram dificuldades de vária ordem, mas todas foram ultrapassadas através do esforço dos dirigentes associativos e dos técnicos que contribuíram para o projecto e também dos mecanismos de entreajuda entretanto desenvolvidos.
E quanto à integração de uma visão genuinamente portuguesa nesse projecto?
Os nossos maiores contributos foram em três planos diferentes: vasta experiência de gestão multicultural, o que facilitou o termos assumido muitas vezes papéis de liderança; competência técnica na participação em gestão de projectos internacionais; e o prestígio internacional da APG, que possibilitou ultrapassar algumas dificuldades que a própria natureza do projecto colocou. A visão genuinamente portuguesa esteve presente nomeadamente no terceiro tema do projecto – responsabilidade social das organizações –, no qual a nossa experiência levou a que os parceiros nos atribuíssem a respectiva liderança.
Em que grandes áreas o projecto gerou conclusões? E como explica o enfoque nessas áreas?
O projecto gerou conclusões sobre os temas que constituíam o próprio objecto; ou seja, a demografia, os modelos de gestão de recursos humanos, as boas práticas associativas e a responsabilidade social das organizações. Como conclusões mais salientes, talvez as problemáticas demográficas, que associadas ao nível de desenvolvimento económico das diferentes economias vão colocar desafios brutais à Europa e aos países do Magreb. Na margem norte, a natalidade quase estagnada; na margem sul, ainda a crescer de forma significativa, mas com a melhoria do desenvolvimento económico do Magreb a procura da Europa para trabalhar vai estagnar e talvez estancar, dentro de cinco anos, exactamente numa altura em que a Europa vai necessitar de muita mão-de-obra. Diria que o Magreb como fonte de recrutamento de mão-de-obra para o sul da Europa está a desaparecer. Realço também o domínio da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentado, no qual foi possível verificar os enormes desníveis entre os países da margem norte e os da margem sul, principalmente nas questões ambientais e de eco-eficiência.
Dessas áreas, em qual ou em quais se destacou o contributo de Portugal?
A contribuição portuguesa foi assinalável nos diferentes domínios; mas, necessitando de destacar algo, talvez as boas práticas associativas – onde a revista «Pessoal» foi um dos casos de estudo – e a respeitante á responsabilidade social das organizações, em que a APG demonstrou deter um conhecimento e uma experiência que foram muito úteis a todos os parceiros. Aliás, isso mesmo foi realçado durante o colóquio final do projecto.
Que desafios coloca um espaço que se procura seja de encontro – e neste caso em termos de gestão das pessoas – quando ao mesmo tempo é um espaço que funciona como um muro entre dois mundo, um mais rico, outro mais pobre?
O espaço do Mediterrâneo é um espaço sui generis, pois além de um espaço de partilha de um elemento comum – o mare nostrum, o nosso mar – é também um espaço de partilha de identidades, de referências linguísticas, de histórias de conquistas e reconquistas, de formas de ser e de estar. Ao contrário de outros espaços que, em primeiro lugar, partilham e integram as respectivas economias, o Mediterrâneo é um espaço identitário. E no quadro dessa identidade subsistem modelos de desenvolvimento económico diferenciados, de base continental – os países da margem sul encontram-se no continente africano. As assimetrias – riqueza na margem norte, pobreza na margem sul – resultam essencialmente disso mesmo. Todavia, e paradoxalmente, a riqueza da margem norte depende hoje, essencialmente, da energia produzida na margem sul – principalmente o gás natural da Argélia. O espaço do Mediterrâneo está a reencontrar-se, a reafirmar-se, e não existe já aquele muro que de facto existiu no passado. As economias estão a complementar-se e, nos próximos anos, vamos assistir a um desenvolvimento fantástico nos países da margem sul, que irá esbater os diferenciais de riqueza que hoje são uma realidade.
O que é que aprendeu, em termos pessoais, com a sua participação no projecto «Agora RH»?
Conheci novas realidades geopolíticas e religiosas, encontrei respostas para dúvidas que tinha sobre o que é isto de ser português e de ser mediterrânico, reencontrei algumas raízes… E se calhar construí uma nova visão deste espaço de História e de memórias que, seguramente, é o nosso espaço. Nós somos daqui.
1 comentário:
Pela primeira vez no blog e já fiquei fã... Inicio, agora, os primeiros passos no mundo dos RH e, tendo pesquisado acerca de si, só posso dizer que quando for "grande" quero ser assim...
Cumprimentos
Enviar um comentário