segunda-feira, 16 de abril de 2007

Mediterrâneo RH (3)

De entre os entrevistados não portugueses do projecto «Ágora RH» (explicação do projecto no post 1 sobre este tema), o primeiro que trago aqui é o representante da associação argelina de recursos humanos. Começo por ele devido ao facto de quando o entrevistei ser o presidente da Federação Mediterrânica de Recursos Humanos. Na foto, aparece a intervir durante a abertura dos trabalhos, interpelado por um jornalista francês que fazia de moderador sempre a andar de um lado para o outro.

Ahmed Mana (Argélia)
«A Europa não pode construir um muro.»

Ahmed Mana, presidente da Association Algérienne des Ressources Humaines (ALGRH), é também o presidente da Federação Mediterrânica de Recursos Humanos (FMRH). Está reformado, depois de uma carreira como quadro superior do Estado num dos maiores ministérios da Argélia (Ministério da Energia e das Minas).
Para si, o espaço do Mediterrâneo, com tantos países, é um espaço de união?
Geograficamente há uma unidade à volta do Mar Mediterrâneo; esta é a primeira ideia. Segunda, há muitas coisas à volta do Mediterrâneo. Sou obrigado a falar das invasões. Tivemos a invasão turca, a árabe, tivemos a Europa na Síria, na Argélia, em toda a África do norte. Isso deu em trocas, em misturas da cultura de uns e de outros. E assim foi construído um passado histórico muito forte, ainda que construído sobre a dor. E hoje é preciso fazer a mesma coisa, mas sem passar pela colonização, pela guerra. É preciso que aconteça pela compreensão, pelas trocas. Creio que se pode assim construir um Mediterrâneo de países, que será algo grandioso a partir do contribuo dos pequenos países. Os norte-americanos construíram a grande América com pessoas originárias da Europa, de diferentes nações, de diferentes culturas. Mesmo a própria Europa, que é outro grande espaço, construiu-se com o norte, o centro, o leste, os latinos, os eslavos. O mesmo se pode fazer tendo como elemento aglutinador o Mediterrâneo.
Quando se fala do Mar Mediterrâneo, pode falar-se numa zona de proximidade, de partilha, mas também se pode falar numa barreira. O que pensa disto?
Antes a mudança era no sentido inverso que acontece agora, os europeus é que se iam instalar nos países do outro lado do Mediterrâneo. «Vós sois o que nós somos», diziam os franceses aos argelinos, aos marroquinos, «vocês são franceses». Os italianos faziam o mesmo, tal como os otomanos em tempos, e os árabes quando entraram na Península Ibérica. As trocas que se aconteceram no passado, com violência, deverão fazer-se de novo, agora sem violência. Veja, por exemplo, a questão da emigração… É preciso perceber que se as pessoas do norte de África viajam para a Europa é porque existem razões para isso. Não é só ir por ir. Há razões, que são múltiplas… Económicas, o atraso dos seus países, as necessidades que têm em África, as doenças, etc. Por que é que esses países estão nesse estado? Por serem os piores do mundo? Não creio. Os ocupantes, por exemplo, do Uganda, do Senegal, utilizaram a riqueza e não deixaram nada. Foi gente que sempre repartiu a zero. E depois, uma segunda questão… Quem está no poder nos países pobres usa as riquezas como um colonizador, abusa das pessoas, do seu próprio povo. E uma terceira, no plano económico, a da mundialização… o que é isso? É a livre circulação de capitais… É o domínio da tecnologia, felizmente… Estou na Argélia, mas estou ao mesmo tempo em todo a parte, graças à Internet, à televisão, etc. É preciso que haja trocas de pessoas. A mundialização é uma livre circulação de todo o mundo. Se cada pessoa respeitar as outras, os seus valores, as leis, não haverá problemas. Não deve haver uma fronteira entre um mundo e outro. Porque quando há fronteiras há também o risco de partir um povo em dois; isso passa-se em Israel e na Palestina, ergueram um muro para separar dois povos que não têm diferenças, que vêm da mesma árvore genealógica. Ou seja, a Europa não pode construir um muro. Que haja controlo da emigração, sim, mas não com a ideia de que quem está, fica connosco, e os outros nunca poderão entrar.
Como é que caracteriza a gestão de recursos humanos na Argélia?
Durante o período colonial era, obviamente, a gestão de recursos humanos dos franceses. Quando os ocupantes partiram, em 1962, continuámos a trabalhar sobre os mesmos modelos, com os mesmos métodos; a maneira de ver os recursos humanos era a mesma. Depois, houve mudanças importantes. Deu-se muita importância à pessoa, escolheu-se verdadeiramente a abordagem socialista. O trabalhador ganhou muito poder no seio da empresa. Tinha-se saído de um período doloroso de guerra, era preciso dar esperança às pessoas, deixá-las respirar, mais do que ser exigente. Esse período de estabilização foi um pouco longo, por isso é que chegámos um pouco tarde ao manegement. A seguir já na década de 1970, no início, o país fez um grande esforço ao nível da formação. Ao nível da indústria, ao nível da qualificação dos quadros. Como a tinha sido feito em França, nos Estados Unidos, em Inglaterra etc. Infelizmente, depois disso houve decisões económicas e políticas que não permitiram um desenvolvimento individual e colectivo dos recursos humanos. A conduta centralizada, não se dava poder ao gestor, às pessoas que trabalhavam na direcção de recursos humanos. Havia directivas, digamos assim, superiores, e pronto. Agora é diferente. Na Argélia aposta-se na formação, temos muitos institutos que o fazem, nomeadamente em gestão de recursos humanos.
Qual é o papel das mulheres nas empresas do seu país?
É preciso partir da ideia de que no meio urbano as mulheres emancipam-se cada vez mais. Elas trabalham, participam. Já no mundo rural a abordagem é mais familiar. Mas a participação da mulher ainda não é importante na economia argelina. Creio que na administração pública chegarão a 20%, talvez 25, dos efectivos, e no sector público económico a 15, talvez 20%. Há um esforço a fazer. Creio que o papel da mulher nas empresas se tornará mais importante. Quanto à política, já é magnífico.
Actualmente?
Sim, há partidos que são dirigidos por mulheres, temos mulheres que são deputadas. Até nalgumas empresas há mulheres em posições dirigentes.
Posições verdadeiramente de decisão, em empresas?
Sim. Por exemplo, uma das maiores empresas do país, a décima ou décima primeira a nível mundial no seu sector de actividade, a responsável executiva de recurso humanos é uma mulher.
A Argélia, neste aspecto, é muito diferente dos outros países do Magreb?
Não. Somos do norte de África, do Mediterrâneo, tivemos o período colonial, partilhamos os mesmos valores, e por isso não há uma grande diferença: Talvez só no número de habitantes e nas riquezas naturais.
Fala de Marrocos, Argélia e Tunísia… O caso da Líbia, por exemplo, já é diferente?
É como na Europa. Há gente que vai mais para o Médio Oriente; parte da Tunísia e a Líbia. É preciso ver, por exemplo, que a Tunísia e Marrocos estão a distâncias bem diferentes do Médio Oriente.

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