sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Uma entrevista a Fernando Carvalho Rodrigues

Uma entrevista que fiz em 2005, ao pai do primeiro satélite português, o cientista Fernando Carvalho Rodrigues. Publico-a agora aqui, na íntegra.

Canoa, por onde vais

«Canoa, por onde vais, parece-me que não vais muito bem», talvez diga baixinho algum segurança numa doca da cidade «convertida ao plástico» ao ver aproximar-se o professor Carvalho Rodrigues a comandar a sua canoa de 1937. Mas isso é uma coisa que tem mais a ver com o final da entrevista. Talvez aqui nesta abertura estejamos a viajar no tempo, distraídos, e ainda por cima sem pensar nas portagens que as regras do jornalismo impõem.

Deixando as viagens no tempo, comecemos então – como dizia, enfim, como dizia o outro – pelo princípio. As viagens no tempo, de qualquer maneira, não vão demorar.

Já o ouvi falar sobre a moeda de hoje ser o tempo. Pode explicar essa sua ideia?
Sim, o tempo é a moeda. Paga-se horas de trabalho, horas, minutos e segundos de comunicações… O tempo até determinada altura era utilizado para a as pessoas darem destino a umas coisas ou a outras, mas nós inventámos que agora é para dar a felicidade a toda a gente. É a busca incessante da felicidade, que não leva a lado nenhum. Depois de inventarmos isto, passamos a vida a correr de felicidade em felicidade. Mas esta maneira de fazer passar pensamentos via telefone, via rádio – que são as duas grandes invenções deste último século, invenções da tecnologia… Como não há pensadores, há só pensamentos. Os pensamentos são expressos em linguagem, a gente paga e a moeda é o tempo. O que acontece é que somos todos muito pobres de tempo. A evolução da humanidade é um bocado como no início da agricultura, quando a maior parte das pessoas morriam de fome. Na agricultura é o espaço a moeda. Na caça também. Quanto mais espaço, mais caça. Era assim o território. Hoje é quanto mais tempo se tem. Nós ainda somos miseráveis e pedintes do tempo. Milionários do tempo existem muito poucos. Aqueles que são capazes de viver, de dar destino a coisas, sem se importarem com o correr do tempo.
Falou de antes se morrer de fome, que é algo ainda acontece no mundo. Mas agora também se pode morrer de tempo, com o stress
Bom, nós estamos a dar os primeiros passos nesta aprendizagem de nos alimentarmos de tempo. A tecnologia fez com que pudéssemos partilhar ideias uns com os outros. E quem tem relógio no pulso não tem tempo. O que mais dizemos uns aos outros é «não tenho tempo». Ora uma pessoa que não tem tempo é um pedinte do tempo. Quanto maior for a conta bancária menos tempo tem. É curioso.
Pois…
Estamos adaptados ainda a ser seres que dominam o espaço, mas não que dominam o tempo, uma coisa relativamente recente. Os relógios são relativamente recentes, esta coisa de ter que andar com uma algema do tempo no braço esquerdo. Tal como a capacidade de passar os pensamentos uns para os outros via rádio, tem para aí 170 anos. Na área do tempo somos uns pobretanas. Se a edição da «Forbes 500» fosse de milionários do tempo se calhar bastava uma página.
Também se ouve falar muito, especialmente no mundo das empresas, de gestão do tempo. Há inclusive cursos sobre o tema. Acha que se justifica chegar a tanto, ou a gestão do tempo poderá, afinal, ser algo bem mais simples?
Isso acontece porque o tempo é um bem muito escasso. Quando eu digo que nos alimentamos do tempo, significa sermos capazes de antecipar. Como na caça, ou na agricultura, precisamos de antecipar o espaço. Qual vai ser a cultura do Outono para o Verão. Atirar a seta ou o dardo para a frente da presa, para onde ela vai passar. Quando se atira é preciso prever no espaço onde está a presa. A gestão do tempo também é antever no tempo o que é que se vai estar a fazer num determinado momento.
Há aqueles teóricos do pontapé na bola que falam de fazer o passe para o espaço vazio, para onde algum jogador vai correr…
Pois, é preciso prever o que vai acontecer. A gestão do tempo é isto, não é muito diferente do que fazíamos no espaço. É antecipar para prever e para algumas vezes tomar contra-medidas, para impedir que algum mal aconteça. É o que nós fazemos. Estamos a aprender a gestão do tempo. Aliás, já começamos a ter uma coisa que não havia há uns tempos, a agenda. Se perguntar a uma pessoa de uma pequena aldeia, «quando é que nos encontramos?», ela pode responder «amanhã», se perguntar «quando?», ela pode responder «à tarde». Por quê? Numa sociedade que ainda se alimenta do espaço, esta antecipação que pode significar à uma hora ou às oito da noite, à tarde é quanto basta. Para nós, que somos pobres do tempo, isso é impossível. Temos que antecipar o tempo para ganhar, para ter tempo no banco. Uma pessoa que tenha duas horas durante as quais possa estar sem fazer nada, é tempo. O problema é que as pessoas não têm tempo, de modo que só há um processo de fazer as coisas, é antecipar, como se antecipava quando só nos alimentávamos de espaço.
Uma vez ouvi-o falar do segredo para isso, fazer uma coisa de cada vez. Continua válido?
Pois, é o que faço, uma coisa de cada vez até ao fim, como se nada mais existisse.
Mesmo que demore muito?
Mesmo assim. Fazer atrasos com combinações de outras coisas e fazer isso de forma sistemática é roubar tempo aos outros. Ainda não há legislação contra isso, mas haverá um dia. Porque nós somos os únicos animais que se alimentam de espaço e de tempo. O resto da bicharada, e também os vegetais, alimenta-se de espaço. Caçam ou comem vegetais ou plantas no espaço. Nós caçamos no espaço e alimentamo-nos no espaço, mas também nos alimentamos no tempo, de modo que podemos roubar tempo uns aos outros, e roubamos. Quando alguém diz que gostava que as coisas fossem mais eficazes, o que quer é mais tempo para si, para ter tempo no banco.
Como passa o seu tempo na NATO?
Eu dirijo um projecto que se chama «Novas Ameaças e Desafios», que tem a ver com antever o que vão ser as ameaças à humanidade, ao mundo.
O futuro…
Tem a ver com antecipar, com ganhar tempo.
No seu último livro diz que passou toda a vida a olhar para o futuro.
É verdade.
Se calhar foi por isso que na NATO o escolheram…
Deve ter sido essa a razão. Há um segredo de todas as alianças, que é antecipar para impedir que aconteça alguma coisa má. Tem de se fazer tudo em antecipação.
O termo «futuro» é aplicado a torto e a direito nos nossos dias, «ganhar o futuro», «o futuro é já amanhã», «uma janela aberta para o futuro»… O que acha disto?
E «os jovens são o futuro»… Tudo mentira. Aliás, nos humanos os jovens são tanto o futuro como os velhos. A comunidade inteira é que é o futuro. Cada geração, por si só, separada, não tem qualquer futuro. Mas a antecipação do futuro é para gerir o tempo, é a grande actividade de gestão do tempo. Houve uns homens no século XVII, que andavam à procura da diferença que há entre as causas e as razões. E há muitas diferenças. Hoje tendemos a confundir muitas vezes causas com razões. Por exemplo, alguém sobe para cima de um banco e estatela-se, e diz que caiu porque subiu para cima do banco. Não é nada… Caiu é a razão, a causa é a atracão da gravidade, se esta não existisse não havia causas. Nós misturamos muitas vezes as duas coisas. E então no caso do tempo ainda mais. Porque nesse tal século XVII, há 400 anos, houve uma ideia que veio por acaso da teologia moral e depois migrou para a física, não ficando cultural, que é o princípio do mínimo da acção. A natureza faz as coisas com um mínimo de acção. E o mínimo da acção é o produto da energia vezes o tempo, e a acção para fazer seja o que for nas nossas vidas é a energia para o fazer vezes o tempo que se leva a fazer. Se eu, sem gastar energia conseguir, antecipar as coisas de tal maneira que diminua o tempo com que as faço, estou a contribuir para uma aproximação da maneira de fazer as coisas à maneira de fazer as coisas do universo. Por acaso, é uma coisa curiosa, não é muito diferente do mínimo do esforço. Se caminharmos para aí, somos capazes de ser milionários do tempo.
Tudo o que disse tem algo de matemático…
É. É quantificável. O que é curioso é que as pessoas nunca tenham usado estes parâmetros, parâmetros da acção, algo que é facílimo de medir. Para medir a inovação, para medir se estão a fazer uma gestão correcta do tempo, se estão a ficar com tempo para elas.
Por que é que diz que somos todos matemáticos?
Porque temos as noções fundamentais da matemática. Temos a noção de ritmo, as noções de maior, menor e igual, as relações, portanto. Depois, o resto é ter boa vontade para aprender uma linguagem. As pessoas muitas vezes não gostam é de escrever e de ler matemática.
As más notas a matemática, em Portugal, têm a ver com isso?
O problema é um bocado generalizado, existe em todo o lado, porque as gerações ensinam umas às outras que não temos jeito para a matemática. Toda a gente tem jeito para a matemática, uma linguagem, e uma língua, que quase não tem semântica. A matemática é uma língua de sinais, e as pessoas têm de aprender esses sinais, só que como não se usa essa linguagem para namorar as pessoas têm uma certa aversão a aprendê-la. E é uma linguagem lindíssima, de um poder fabuloso. Não é assim muito diferente do latim, escreve-se umas coisas que simbolizam outras. Por exemplo, o sinal de mais, que as pessoas têm hoje como uma coisa corrente, só tem 300 anos, antes não havia, nem o sinal de igual, que foi inventado para descrever esta palavra, «igual», relativamente recentemente. A linguagem matemática é uma coisa que tem vindo a evoluir. A notação, especialmente a notação, aquilo que se escreve…
Vão surgindo mais símbolos?
Sim. E os símbolos vão sendo cada vez noções mais gerais. Outra prova de que todas as pessoas são matemáticas: toda a gente sabe o que é uma laranja. Mas o que raio é uma laranja? É de casca grossa, é pequena, é grande, é encarquilhada, é o quê? É uma coisa que não existe. É um limite da classe de um conceito. No entanto, ninguém hesita em dizer «dê-me cá três laranjas». Toda a gente sabe o que é, mas quando se olha para o conceito ele é de uma abstracção enorme. Não há duas laranjas iguais, e no entanto diz –se «dê-me três laranjas».
Faz lembrar o investigador que dizia com um enorme fascínio que nunca tinha encontrado duas moscas iguais?
Claro que não, mas falava na mosca. Essa vertente é matemática, a capacidade de abstracção que leva a falar na mosca quando não há duas iguais. Quando se diz «a mosca» quer-se dizer o conceito de uma abstracção imensa, que tem uma força terrível. Por quê? Toda a gente sabe o que se quer dizer. Quando eu digo «uma laranja», toda a gente sabe o que eu quero dizer. Se eu escrever «1+1», esta notação, não é preciso andar os primeiros anos da escola para perceber que aquilo é somar uma laranja mais uma laranja, mas esta notação e esta linguagem querem treino. Como não é uma linguagem que se utilize todos os dias, as pessoas interrogam-se sobre para que é que serve. Aliás, a maior parte das críticas têm a ver com isso.
E serve para…
A matemática serve para fazer este mundo. O mundo da tecnologia e o mundo da ciência, sem matemática, teria grande dificuldade em existir. O mundo da técnica é diferente, porque há muitas coisas que se fazem e que não percebe por que é que é assim. E coisas triviais. Não há modelo para a fiação. Por que é que se fazem fios tão bons para as camisas? Não se sabe. Faz-se assim há 1.000 anos, depois há uns modelos, umas coisas, umas fantasias, e pronto. Não somos capazes de matematizar tudo. Isto é curioso, porque de cada vez que se é capaz de matematizar qualquer coisa é-se capaz de antever, e quando se é capaz de antever está-se a fazer uma gestão do tempo. Somos capazes de fazer de escrever as equações dos planetas e de saber o argumento. Antevê-se a posição deles, que dá uma enormíssima economia de meios para os detectar, para ir até eles, para não nos assustarmos quando vemos um cometa, ou para sabermos para onde vão os aviões. Tudo equações.
Referiu-se à tecnologia… Fala-se muito agora de tecnologia, e de estarmos na sociedade do conhecimento. Mas sempre houve tecnologia, assim desde sempre há uma sociedade do conhecimento, não acha?
Quando se está numa profissão, seja qual for, há o gesto da profissão e o entendimento do gesto da profissão. O entendimento do gesto é o conhecimento sobre a profissão. Quem tem o conhecimento da profissão pode chegara a estádios de antecipação no tempo, a eficácias, ou seja, a mínimos de acção, a mínimos de energia vezes o tempo. A minha metáfora para isso é uma pessoa que dá tacadas nas bolas de golfe. A vasta maioria tem o gesto, mas não tem o entendimento que têm os profissionais. Estes sabem em cada momento rigorosamente o que devem fazer. Têm o conhecimento do gesto da profissão. Fazem com que aquilo pareça muito fácil, fazem coisas incompreensíveis para o comum dos mortais, que só tem o gesto. Ter o conhecimento é ser capaz de ter argumentos para antecipar o que vai acontecer, para ganhar tempo. Mas as sociedades sempre foram da informação e do conhecimento. Agora é que se diz que há mais conhecimento.
Também há quem se queixe de que a informação é muita…
Há. Nesta área, nós gastamos o nosso tempo e há donos do tempo, tipos que cobram... Toda a indústria de telecomunicações… É uma indústria de cobrar portagem a quem anda a fazer viagens no tempo. Claro que para essas pessoas, as donas das auto-estradas do tempo, a quem pagamos milionariamente por horas, minutos e segundos, quando ficamos lá pendurados, quantos mais de nós lá andarmos melhor, de modo que inventaram que agora era bem era todos termos um conhecimento à brava. Por exemplo, eu estou ligado à Internet a ver conhecimento que anda por aí, e pago uma portagem do tempo. Pode ser muito pequenina, mas somos tantos a andar que dá um valor incomensurável. Agora isto é a vertente do negócio das telecomunicações, que é o que está a empurrar esses slogans todos da sociedade do conhecimento.
No seu livro também fala de ‘mare liberum’, ligado à ideia de ‘software liberum’. E viagens do tempo livres, será possível?
Bem, vai ser uma luta terrível.
Aliás, o software também não é livre.
Pois, não há software liberum.
Nem mar.
Pois, não há mare liberum. E se houvesse software livre havia aí uma espécie de mare liberum. Enquanto não houver é dos operadores que estão de serviço. Na metáfora do século XVI, os portugueses também não deixavam ninguém andar de um lado para o outro livremente. Era a nós que pagavam portagem.
Fazíamos de Bill Gates…
Rigorosamente isso. Entre o Vasco da Gama fazer com uma tripulação portuguesa a viagem para a Índia em 1498 e uma tripulação holandesa conseguir realizar o mesmo feito, entre as duas coisas demorou 100 anos. Os holandeses chegaram ao comércio do Oriente com uma tripulação holandesa e um comandante holandês em 1598. Durante 100 anos era o mar fechado, o mar de quem descobria. Enfim, continuamos nessa fase.
Por que é que fala em «ousadia de descobrir»?
É a ousadia de dar o destino e de descobrir.
Mas por que é que é uma ousadia?
Ousar dar destino, fazer uma coisa nova, é algo que não é natural nos humanos. Os humanos não gostam do que é verdadeiramente novo. Gostam da moda. Porque a moda é simples. O que é verdadeiramente novo só tem dois processos de entrar na cultura de toda a gente. Ou por extorsão, ou seja, à orça ou à pancada, ou então depois de passados uns anos a olhar para o lado e a ignorar que existe há um dia em que se diz «olha que engraçado, existe». Aparecer uma coisa completamente nova é muito difícil. Na história da humanidade não há assim 20 coisas verdadeiramente novas. Há melhorias. E agora estamos a viver uma coisa nova, ou antes, duas.
Que são…
Uma coisa nova é a capacidade de projectar o nosso pensamento para uma comunidade muito larga e de alguma maneira sermos quase como telepatas. Eu expresso o meu pensamento, sou capaz de o expressar em linguagem, e posso espalhá-lo universalmente via telecomunicações, mas pago uma portagem. A outra coisa de que estamos a começar a ser capazes, como aprendemos parte da linguagem química da vida, é de manipular seres vivos. Porque percebemos a linguagem química da vida. Ainda estamos muito longe de sabermos a linguagem da física da vida. Quando soubermos essa, então vamos mesmo fazer seres vivos.
Qual é a grande diferença?
A enormíssima diferença. Hoje sabemos os tijolos que tem, e sabemos como que colocá-los. Se soubéssemos a linguagem física da vida, sabíamos fazer os tijolos.

Mas há um dilema nisto. Há uma citação do «Génesis», sobre o conhecimento do bem e do mal… Ora, os que se arrogam do conhecimento perfeito e absoluto do bem e do mal vão estragar o conhecimento que existe. Nós temos um bocado de conhecimento envenenado. Mercê de sabermos a linguagem física da matéria e de sabermos a linguagem química da vida, temos a capacidade de fazer objectos que podem levar à destruição da humanidade.
Será que aqui é que entra a inteligência?
Aliás, é um paradoxo terrível: por sermos inteligentes, fazemos objectos que são do bem e do mal. Ao mesmo tempo que fomos descobrindo aqueles dois conhecimentos, a linguagem física da matéria e a linguagem química da vida, nós fomos fazendo os objectos para nos destruirmos. De modo que é quase para pôr em dúvida se uma espécie que às tantas ainda se destrói é inteligente. O paradoxo é este: nós sermos inteligentes faz com que sejamos o maior predador que existe na natureza. E quanto mais inteligente, mais predador. Ao pé de nós, o Tyranosaurus Rex haveria de parecer um bichano domesticado. Eu não acredito que nós tenhamos sido feitos para tomar conta da natureza e essas coisas. Fomos feitos para viajar por fora dos planetas, para ir colonizando planetas. E, como todos os predadores, à medida que vamos passando por um planeta vamos destruindo esse planeta. É assim que os predadores fazem.
E qual é que será o fim? Se é que esta história tem um fim…
Hum…
Não há fim…
Eu acho que nós vamos colonizar neste próximo século o sistema solar e depois vamos começar a viajar para lá dele. O que é que faz o predador? Caça num sítio e quando a caça se esgota vai para outro.
E o planeta Terra, quantos anos ainda aguenta?
Bem, nós já começámos a ir para o espaço exterior. Foi assim em todas as estradas… Uma vez começando, nós vamos, ninguém pede licença. Vão morrendo uns pelo caminho, outros aprendem umas coisas. Foi assim há 600 anos, com os aviões foi igual, há cem anos. E agora vamos para o espaço exterior. Nós inventámos uma coisa muito antiga, e foi nossa grande libertação, uma coisa que nos deu mobilidade: os avós. Eles são a grande gestão do tempo. A história dos netos e dos avós se darem tão bem, é porque são da raça humana. Liberta-se os que estão na pujança física e no auge de todas as suas capacidades intelectuais para andarem na vida de todos os dias. Foi a descoberta que garantiu o futuro da humanidade. Qual é o truque? É comunidades atrás de comunidades. Quando se diz o futuro é a juventude, isso é a maior das alarvidades e só serve para ganhar votos aos coitados inocentes de dezoito anos. O futuro está nesta comunidade toda. Agora vamos sair para o espaço exterior, e começamos a aprender a gerir tempo, mas ainda temos que fazer um grande percurso. O espaço nós mais ou menos gerimos, até fazemos guerra por causa dele.
Acha que vai haver guerras por causa do tempo?
Você já viu os donos de um canal de televisão a quem dá o tempo? Eles pegam no seu tempo e vendem-no para anúncios. Essas pessoas são poderosíssimas. Portanto, vai haver uma de duas coisas: ou uma disseminação e toda a gente andará a fazer o seu próprio canal de televisão, com tudo engarrafado – e Deus queira que seja assim, porque vai no sentido do ‘mare liberum’, e há sinais disso com a Internet –, ou não. É curioso que nas comunicações as fronteiras não foram abolidas. É das coisas mais fascinantes que já vi. No espaço, não há fronteiras entre Portugal e Espanha, mas nas comunicações há, os operadores mudam, telemóveis, televisão…
Parece que é o único sinal de fronteiras?
É o sinal dos tempos. É a única coisa que vale a pena preservar, para se ser dono do tempo. Portanto, aí haver grandes confrontações. E no espaço exterior, onde o último dos comandos existe. O último dos comandos das estradas do tempo, que são as telecomunicações, está nos satélites. Isso aí é que há mesmo donos do tempo. Para falar para os Açores, para a madeira, de Portugal, tem de ser por satélite. Quem for o dono do satélite manda mesmo. E é curioso que não são os Estados os donos.
O senhor é conhecido como o pai do primeiro satélite português. Foi há quanto tempo?
O satélite está lá faz em Setembro doze anos.
O que é que o satélite está a fazer agora?
Faz comunicação entre 140 estações no mundo de uma organização que é a Vita, norte-americana. Nos Estados Unidos dizem «vaita». Faz trabalho de trouble shutting, ou seja, resolve problemas em explorações agrícolas.
Tinha uma equipa a trabalhar consigo…
Há dez anos éramos 43. Agora ficaram dois ou três em Portugal, os outros saíram.
Como é que era gerir essa equipa?
Isso aí que é por antecipação total. Como há sempre uma hora e uma data de saída, que é a saída do satélite, é gerir pessoas e gerir fluxos financeiros. Tem de estar tudo certinho para acontecer na hora e no momento exactos. É gestão do tempo à séria, por antecipação. Daqui a dois meses às não sei quantas horas, vai acontecer isto. O facto de sabermos isto de antemão faz-nos ganhar tempo.

Ainda no outro dia estive a ver a lista dos países que têm satélites. São muitíssimo poucos. Portugal tem um. A Coreia, que lançou no mesmo dia que nós, já tem dezassete.
E os países da União Europeia?
Nem todos têm, nem com a Europa a quinze. Nós tínhamos grande tradição nisto, as OGMA, a Efacec. Tínhamos grande tecnologia, mas depois o país desindustrializou-se.
Tem alguma explicação para Portugal e os portugueses serem associados a uma certa aversão à inovação?
Isso todos os povos são.
Nas comparações diz-se que somos dos mais avessos.
O tempo ainda é muito barato, a hora ainda é barata. E como tal as pessoas desperdiçam muito tempo e talento O grande problema de Portugal é que se desperdiça muito: começa-se projectos, muda o governo e acabam, depois chega outro ministro do mesmo governo e diz que é de outra maneira. Tudo por razões de ignorância. Há uma péssima gestão do tempo, mas não dos portugueses, é dos governantes.
Nas elites a coisa é mais grave…
Gravíssima. Estou a falar é das elites.

O nosso povo sabe muito bem o que quer e para onde vai. Quando ouço aquelas coisas de que vai acabar Portugal… Quem subscreve isso são fundamentalmente pessoas que trabalham para o estrangeiro. Não têm nada a ver com os portugueses.
Saiu há pouco tempo um relatório que a nível europeu colocava Portugal como um dos países mais xenófobos…
Mais?
Xenófobos.
Com medo dos estrangeiros?
Falou-se muito, até deu uns fóruns sobre o assunto e mais uma coisas…
Não vi esse estudo, mas pelo conhecimento que tenho do mundo acho que só podem ter sido inimigos nossos a escrever isso. Os nossos inimigos tradicionais estão todos na Europa.
Somos assim tão importantes?
Nós e os ingleses, e um bocado os holandeses, fomos os únicos que ousámos dar um destino ao mundo. Existe hoje, sempre existiu, um total desconhecimento do que é o sul da Europa. É como medir os parâmetros de desenvolvimento pelo consumo de vidro e de aço. Nisso os americanos estão à frente da Europa. No outro dia fui com umas pessoas dar uma volta a Lisboa, e passámos pela zona da Expo. Só me apercebi do nojo que é a zona da Expo quando um norte-americano me disse «ó pá, isto é contrário ao que qualquer país do sul da Europa devia fazer, vidro por todo o lado, gastos brutais em ar condicionado, vocês foram mais uma vez colonizados pelos tipos do norte, que disseram que isto é que é bom, disto também nós temos na América». Aquilo não é português, nem coisa nenhuma, e eu fiquei a abominar a zona.
Os portugueses parece que adoram ir para lá passear…
Há mais gente a ir passear para os Jerónimos.
Eu nem uma coisa nem outra...
Está limpo, está não sei o quê, tem ar condicionado… Mas alguém está a pagar esse ar condicionado. Isto é as elites. Nós deixamos de pensar pela nossa cabeça. E as nossas elites são profundamente ignorantes. Se perguntassem as coisas às pessoas, elas eram capazes de dar uma contribuição. Mas ninguém pergunta. As administrações em Portugal nunca perguntam a ninguém, mandam e pronto. Então se houver uma pessoa na organização que já fez alguma coisa, é garantido que a essa não se pergunta nada.
E aquilo de sermos xenófobos?
Pois… É como o caso dos problemas da mulher. No norte da Europa esses problemas são muito mais agravados do que no sul. As pessoas do norte ficam admiradíssimas quando chegam ao sul e vêem tantas mulheres em directoras-gerais. Tudo isto é engendrado. Existe uma tremenda desonestidade intelectual. O orçamento não chegou para irem ver no terreno e agarraram-se a uns parâmetros que são relevantes no norte da Europa, mas não são no sul. Em Portugal toda a gente é muito pobre, e os pobres dão-se bem uns com os outros, independentemente da língua, ou de onde vêm. Nós sempre integrámos toda a gente no nosso seio, sem dar conta.
No seu livro escreve a certa altura que a mudança do mundo está a mudar. Lembrei-me de uma coisa da moda, no mundo das empresas e não só, a mudança, ou até, do mundo em constante mutação, que é uma expressão que já irrita.
Vou-lhe dar a chave do título do livro, «Convoquem a Alma». Chama-se assim por causa do que vou dizer. Tem a ver com a mudança da mudança. Nós, os humanos, temos um método para viajar, e é o que fazemos. Viajamos de um objectivo para outro, de uma coisa para outra. Quando vamos numa estrada com tapete de alcatrão, sabemos que estamos em movimento porque temos referências, olhamos e vemos o carro a andar. A velocidade vê-se. A velocidade da transformação numa organização vê-se. Quando meto a aceleração, ou seja, quando meto esforço, faço força, seja no avião, seja no carro. Sinto com o corpo todo. É assim que sentimos a aceleração. Sabe-se que uma coisa está a acelerar quando sente com o corpo todo. Mas se houver um buraco na estrada, se passar lá um pneu, aquilo dá um abanão, e então nós temos um método, mesmo aqueles que dizem que não acreditam na existência da alma: convocamo-la. Porquê? Porque quando o pneu passa no buraco há uma grande variação da aceleração. É a mudança da mudança. Há uma enorme mudança da mudança. Estava a mudar de uma determinada maneira e depois mudou de outra maneira. De cada vez que há uma mudança da mudança, nós não somos capazes de prever o futuro, não conseguimos fazer gestão do tempo. Pode ser um pneu a rebentar, pode ser a jante a ficar empenada, o carro capotar. Isto nós não somos capazes de prever. Então, o que é que fazemos? Convocamos a alma para preparar o corpo. Mas a maior parte das pessoas, e das organizações, a maior parte anda assustada, porque ainda não convocou a alma.

E uma coisa curiosa, relacionada com a mudança das mudanças, É também uma das crónicas do livro, a que se chama «Matriz». Hoje vivemos tempos em que por causa da mudança das mudanças as pessoas não convocam a alma e não ousam dar um destino. Andam à procura de um Messias. Os êxitos do cinema têm o tema central de andar à procura de um Messias, a matriz, a mãe de tudo. Um conjunto de iniciados vê chegar alguém com uns determinados sinais, alguém que vai ser o salvador, o Messias. «O Senhor dos Anéis» não é outra coisa senão a busca do Messias, e é de uma violência… Estão a preparar a juventude para uma violência brutal. Os filmes de cowboys eram uma coisa justa, de um contra um. Agora não, agora é coisas imensas contra coisas imensas, e um dos lados pura e simplesmente faz a obliteração do um, do oponente, não sobra ninguém. No último «O Senhor dos Anéis» até os mortos são convocados para fazer a guerra, e na outra banda não sobra vivalma, são hecatombes imensas.
Ao menos por cá só se convocam os mortos em determinadas eleições municipais… Mas adiante. Quanto tempo demorou a escrever as crónicas de «Convoquem a Alma»?
Dois anos e tal, três.
Tinha alguma ideia de continuidade?
Tinha a ideia de dar uma mensagem de que nós temos um grande mecanismo de ousar, de dar um destino, que é convocar alma. Quando há uma mudança da mudança… Um ser humano nasce, dá um grito, convoca a alma. Alguém com uma transformação muito grande na vida, convoca a alma. Está na altura de convocar a alma e de esquecer os messias.
A alma acaba por ser cada um de nós…
É o grande mecanismo que temos. Eu até nem saio da física. A velocidade vê-se, a aceleração sente-se no corpo. Quanto à variação da aceleração, aí nós convocamos a alma.
Tem alguns planos de voltar a Portugal?
Eu volto quase todos os fins-de-semana. E então agora que tenho uma canoa…
Pois, fala dela no livro.
As canoas são uma coisa sábia… A minha canoa é um autêntico museu, é pena que só haja 55. Foram vendidas com as fragatas para Inglaterra, para a Holanda…
É uma canoa de quando?
É de 1937. Levava quinze pessoas da Praça do Comércio para os estaleiros na outra margem. Tenho um livrete para levar dez pessoas. É uma coisa fantástica, o Centro Náutico Moitense, e outros, em Alhandra e Vila Franca, são eles mantêm a tradição viva. Já do lado de Lisboa, aí só há docas para tupperware.
Iates?
Tupperware. Está lá sempre.
Se calhar a sua canoa não pode lá entrar.
Normalmente não deixam, mas eu entro na mesma, não quero saber. Lisboa, que está convertida ao plástico e agora tem a Expo, que é uma coisa moderna mas que os norte-americanos já têm há uns 100 anos, que não tem nada a ver com Portugal… Enfim, uma espécie de Cacém moderno. Não há do lado de Lisboa quem acolha os barcos tradicionais do Tejo. Nada, zero. A Marinha é que ainda faz o favor de deixar de vez em quando encostar canoas no Cais da Marinha encostar canoas –, presto-lhe a minha homenagem. As canoas, os barcos do Tejo, o resto é fibra de vidro que vem de algum sítio para cá.
Talvez haja muita gente por cá que teria vergonha de andar de canoa.
Não faço ideia. Nem sabem o que é uma canoa. Pensam que é uma coisa na qual há uns fulanos que se metem dentro. Uns fulanos que depois remam.

Fernando Carvalho Rodrigues, licenciado em Física pela Universidade de Lisboa e doutorado em Engenharia Electrotécnica pela Universidade de Liverpool, é director do programa «Novas Ameaças e Desafios», da NATO. Membro de diversas academias científicas internacionais, ensina na Universidade Independente. É o «pai» do primeiro satélite português, o «PoSAT-1». Publicou em 1995 o livro «Ontem Um Anjo Disse-me». O seu título mais recente é de 2005, o volume de crónicas «Convoquem a Alma».

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Edição de Fevereiro

Número 66 da revista «Pessoal» – edição de Fevereiro de 2008. Destaque de capa para os autores de um livro que em Portugal se tornou uma referência em termos de gestão das pessoas.

Passados 10 anos
Desde que surgiu há 10 anos que o «Humanator» se tornou o livro português de referência em termos de gestão das pessoas nas organizações. O seu sucesso fez com que passados cinco anos sobre essa primeira edição tivesse surgido uma nova versão, profundamente remodelada. Agora, depois de 20 mil exemplares vendidos, os autores apresentam aquele a que chamaram o «Novo Humanator», um trabalho que como explicam na entrevista que faz a capa desta edição da «Pessoal» é «um livro totalmente diferente do anterior», porque «para além dos novos capítulos que foram incluídos – sobre gestão por competências, gestão intercultural, gestão do conhecimento e gestão do talento –, foram redigidos de novo praticamente todos os capítulos pré-existentes, inseridos centenas de novos exemplos e eliminados uns quantos que se tinham desactualizado», além de que a «obra foi enriquecida com a inclusão dos casos de estudo da Cap Gemini e do Grupo PT». Os autores salientam ainda um facto, que «as diversas inovações representam uma transposição para a área da gestão das pessoas do novo paradigma de complexidade adaptativa das organizações e são o espelho da evolução da envolvente empresarial e do reposicionamento dos próprios autores sobre estas questões».
Na «Pessoal», achámos que era importante dar destaque ao regresso deste livro, 10 anos passados sobre um acontecimento que de certa forma mudou o panorama em Portugal dos livros que se publicavam nesta área.
Refiro a seguir mais quatro destaques desta edição, que além dos seus circuitos normais de distribuição estará presente na «Expo’RH» para ser disponibilizada aos milhares de participantes deste evento que nos últimos anos se tem afirmado no panorama português dos recursos humanos.
Primeiro, o perfil de Luís Moura, responsável pela gestão das pessoas da ZON Multimédia (a nova designação da PT Multimédia).
Depois, a paixão de uma vida, a de Fernando Moreira da Silva, um quadro de topo da Refer – Rede Ferroviária Nacional. Nada mais, nada menos do que a paixão pelos comboios.
Ainda um ‘dossier’, sobre gestão do desempenho, um tema que tem vindo a ganhar uma importância crescente nas organizações.
E finalmente o texto «empresas que matam», com diversos casos; nuns morrem mesmo pessoas e noutros não morrem só porque não calha. São casos que retratam, infelizmente de forma «perfeita», o que é em muitas empresas do nosso país a gestão das pessoas, apesar de existirem livros como o «Humanator». Deixo um pouco da história da Virgínia… «O director de recursos humanos disse-lhe claramente que no dia seguinte iria ser despromovida das suas funções e do seu posto de trabalho e que teria de se apresentar na empresa diariamente, sem qualquer trabalho para realizar até a empresa ter condições para a integrar num grupo para efeitos de despedimento colectivo. Virgínia perdeu a cabeça, atirou-se ao dito director, deu-lhe os socos e as bofetadas possíveis no acto de surpresa e só não foi mais longe porque através das paredes de vidro do gabinete alguns colaboradores aperceberam-se da confusão e intervieram. O director de recursos humanos não ganhou para o susto./ Muito a custo, Virgínia foi acalmada, sendo formalmente aconselhada a ficar em casa alguns dias até receber notícias da empresa sobre o ocorrido. Dois dias depois, a empresa recebeu a informação de que Virgínia tinha ensaiado uma tentativa de suicídio…»

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Mediterrâneo RH (13)

Mais uma pequena entrevista do projecto «Ágora RH» (explicação do projecto no post 1 sobre este tema); a opinião da representante de França.

Charlotte Duda (França)
«Muitos dos problemas de agora resultam das soluções encontradas antes para outros problemas.»
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Charlotte Duda, presidente da Association Nationale des Directeus et Cadres de la Fonction Personnel (ANDCFP), de França, é directora de recursos humanos da filial francesa de uma empresa norte-americana que trabalha em tecnologias de informação; tem também sobre a sua responsabilidade a área de recursos humanos da filial tunisina.
Na empresa em que trabalha, com as responsabilidades que tem quer em Paris, quer na filial tunisina, sente alguma convergência nas principais questões em que se vê envolvida?
Existe muita convergência. A organização é a mesma, em França e na Tunísia. Há perfis de recrutamento que são iguais. A Tunísia é um país com um excelente nível de educação, especialmente no que diz respeito aos mais jovens. E depois a França e a Tunísia têm uma História comum. Há, é claro, um recrutamento sobre dupla competência francesa e técnica, falar bem francês, conseguir trabalhar em ambientes virtuais… No caso da minha empresa, trabalha-se com equipas que têm características muito específicas. E há uma segunda situação; a Tunísia é um país que está em modernização. Têm muito bom nível cultural, mas têm menos cultura técnica, conhecimento técnico sobre o terreno. Mas fazem um bom trabalho com o mesmo nível de exigência, de cultura, de procedimentos, que em França. De resto, práticas, competências, gestores, administradores, é tudo igual nas duas filiais.
Essa experiência em França e na Tunísia ajuda-a a compreender a filosofia do projecto «Agora RH»?
Sim. Eu tenho a oportunidade de trabalhar directamente em França e num país do Magreb na função Recursos Humanos, e este projecto diz respeito ao Mediterrâneo. Posso vivê-lo verdadeiramente em situação real, ter até uma visão parcial de cada pais, com as suas especificidades. Mas hoje quem tem a função Recursos Humanos na sua dependência tem preocupações internacionais, mesmo que não esteja em funções como as minhas. Os mercados a isso obrigam, porque são internacionais, assim como a concorrência é internacional. De forma que somos obrigados em permanência a saltar os muros da empresa, para ouvir, conhecer outras visões, outras reflexões, de muitos temas, de muitos sectores.
Como e visto o espaço do Mediterrâneo pelas empresas francesas?
É difícil ter uma resposta geral, de todas as empresas. Os grandes grupos há muito que trabalham em boa parte dos países do mundo, e muito nos países mediterrânicos. Em África, por exemplo, fazem enormes esforços para perceber as culturas dos países, procuram adaptar-se. Penso que em relação ao espaço mediterrânico há por parte dos empreendedores uma grande abertura. Depois, existem aqueles problemas que se colocam por exemplo ao nível da diversidade, em França… As nossas universidades, as nossas empresas, muitas abriram escritórios, filiais, agências, em todos os países do Magreb… Talvez seja uma contradição, a economia ajuda, permite fazer uma evolução considerável em termos de mentalidade. Estou segura de que na empresa em que trabalho, para qualquer assalariado, trabalhar noutro país transformou a sua visão das pessoas do Magreb.
Pensa que há diferenças para a visão dos políticos nesta questão?
Penso que há uma evolução de todos os sectores da sociedade. A questão das mentalidades é difícil… Os políticos procuram resolver situações que vêm de há dezenas de anos… Em relação à diversidade, não conheço a posição de cada partido. E a verdade é que muitos dos problemas de agora, inclusive, resultam das soluções encontradas antes para outros problemas.